AVENIDA ANGÉLICA
Distrito: Santa Cecília
Dona Maria Angélica Souza Queiroz nasceu em Rio Claro (SP) no dia
04/03/1842, no seio de uma abastada família paulista. Seu pai, por exemplo,
Francisco Antonio de Souza Queiroz, o barão de Souza Queirós, era filho do
Brigadeiro Luis Antonio de Souza Queiroz (veja Av. Brigadeiro Luis Antonio). Nesse sentido,
Angélica era filha de barões e neta do Brigadeiro Luís Antonio, um rico
empresário que possuía uma das maiores fortunas da época. A mãe de Angélica, d.
Antonia Eufrosina de Campos Vergueiro, também pertencia à elite paulista, uma
vez que era filha do Senador Nicolau Pereira de Campos Vergueiro (veja Rua Vergueiro). No batismo, ela
recebeu o nome de sua avó materna, d. Maria Angélica de Vasconcelos, esposa do
senador Vergueiro. Maria Angélica teve uma educação esmerada e viveu parte de
sua infância e juventude na Fazenda São Jerônimo, em Limeira, propriedade de
seu pai, e em São Paulo onde passava temporadas na ampla chácara da família
localizada na atual Av. São Luís. Justamente por isso, Angélica apreciava a
vida no campo, ambiente este que mais tarde tentou reproduzir na capital. Em
1862, aos 20 anos de idade, contraiu matrimônio com seu primo, também membro da
elite paulistana, o Dr. Francisco de Aguiar Barros (veja Alameda Barros), ele filho de
Bento Paes de Barros, o Barão de Itu, e de d. Leonarda de Aguiar. Logo após o
casamento, o casal manteve residência na chácara de seu marido, então
localizada na Rua Alegre, hoje Brigadeiro Tobias, em Santa Ifigênia. Mas, as viagens
ao interior continuaram, tanto que seu primeiro filho, Francisco, nasceu em Itu
no dia 27/11/1863, sendo batizado em São Paulo aos 29/02/1864. Além de
Francisco, Angélica teve mais nove filhos: Bento, Maria Angélica, Leonarda,
Alfredo, Antonia, Guiomar, Paula, Raul e Beatriz. Constituída a numerosa
família, o casal decidiu fixar residência em São Paulo e, para isso, seu marido
adquire a conhecida Chácara das Palmeiras, onde todos foram residir. Em
decorrência da importância dessa chácara na vida de Maria Angélica e na
configuração da Avenida que hoje leva seu nome, a propriedade merece alguns
destaques:
Chácara das Palmeiras: formada nas primeiras décadas do
século XIX por Antonio Leite Pereira da Gama, em 1849 ela já aparece citada com
este nome nos documentos municipais (Atas da Câmara 20/09/1849). Por volta de
1860 ela é vendida ao médico Germano Frederico Borghoff, de nacionalidade
dinamarquesa, que ali mantinha uma plantação de chá com 5 mil pés, um pomar com
pêssegos, uvas e aproveitava para vender o capim que crescia naturalmente. Como
experiência, cuidava também de algumas vacas leiteiras. Em 1872 Borghoff
mudou-se definitivamente para a chácara, mas ao que parece sua situação
financeira não era das melhores. Desde 1865 ele tentava arrendar a propriedade,
ocasião em que publicou nos jornais um anúncio com esse propósito. Naquela
época, a chácara possuía “uma casa reedificada com cômodos para numerosa
família, senzalas para muitos escravos, estrebarias, cocheiras, pasto de
aluguel, capinzais, quintal grande e bem plantado.” Mais tarde tentou vender a
chácara para a Câmara Municipal, mas não obteve sucesso. Outras tentativas
foram feitas, mas o insucesso da empreitada o obrigou, em 1873, a colocar a
chácara em leilão através do leiloeiro Hilário L. da Silva Breves. O certame
ocorreu no dia 29 de janeiro de 1874, ocasião em que a propriedade foi
arrematada por Domingos Marques da Silva Ayrosa, grande amigo do dr. Borghoff e
proprietário da famosa “Padaria das Famílias”, então localizada na Rua do
Comércio nº 15. Mas eis que em 1876, Ayrosa coloca a Chácara das Palmeiras
novamente à venda, mas sem sucesso. Em 1877 ele permanecia na chácara, ocasião
em que contratou alguns empregados: um cocheiro julho, um caixeiro em dezembro,
sendo que nessa mesma ocasião publicou um anúncio dizendo que pretendia alugar
para si uma escrava para “engomar e demais serviços de casa de família”. Uma
tragédia, entretanto, ocorreria no dia 16 de outubro de 1878, ocasião em que
uma filha de Ayrosa, com pouco mais de um ano de idade, pereceu afogada num
tanque existente na chácara. Certamente por conta desse fato, a família de
Ayrosa decidiu colocar a propriedade à venda. E foi justamente nesse período,
entre 1878 e 1879, que a Chácara das Palmeiras foi adquirida pelo marido de d.
Maria Angélica. Para consolidar esta informação, cabe observar que nos
registros eleitorais da cidade datados de 1879, o Dr. Francisco de Aguiar
Barros ainda mantinha como endereço a sua propriedade na “Rua Alegre”. Ao que
tudo indica, a mudança da família para a Chácara das Palmeiras ocorreu em 1880,
ocasião em que os jornais anunciaram a venda de algumas carrocinhas e animais
que estavam na propriedade e, entre eles, constava uma criação composta por 18
cabeças de vacas leiteiras. É certo de d. Maria Angélica manteve ainda um
pequeno rebanho leiteiro na sua propriedade, pois em 1886 o “leite da Chácara
das Palmeiras” era bastante procurado pela população conforme anúncio publicado
no jornal O Estado de São Paulo no dia 28/07/1886. Inicialmente, a família
ocupou a antiga sede da chácara, um amplo casarão cujos remanescentes podem
hoje serem vistos na Alameda Barros lado impar, esquina com a Rua Albuquerque
Lins, onde se acha a capela de São Vicente de Paulo. Naquela oportunidade, a
chácara possuía um perímetro delimitado pelas atuais ruas das Palmeiras,
Conselheiro Brotero, avenidas Higienópolis e Angélica. Em agosto de 1890, d.
Maria Angélica sofreria um grande golpe com a doença e posterior falecimento de
seu marido, ocorrido no dia 19/08/1890 em sua casa na Chácara das Palmeiras.
Conforme os registros, o dr. Francisco de Aguiar de Barros sofreu uma lesão no
coração posteriormente diagnosticado como insuficiência mitral. Seu corpo foi
sepultado no dia seguinte no cemitério da Consolação. Talvez em decorrência
dessa fatalidade, mas também inspirada na atitude de d. Veridiana da Silva
Prado que construíra seu palacete entre 1883 e 1884 na mesma região, d. Maria
Angélica decide deixar o casarão em que vivia e providencia a construção de um
verdadeiro palacete na Av. Angélica atual nº 430 esquina com a Alameda Barros
atual nº 376. O projeto da casa foi idealizado pelo arquiteto alemão Matheus
Häussler, ele autor também dos projetos da Hospedaria dos Imigrantes e do
Palácio Campos Elíseos. Iniciada a construção em 1891, o palacete estava pronto
em 1893, ocasião em que ela se muda para a nova residência. Deixando a antiga
sede da chácara, Angélica faz a doação de toda a propriedade para a Associação
das Damas da Caridade de São Vicente de Paulo, que ali instalou um orfanato
para meninas e, em 1899, um externato para ambos os sexos. A exemplo da
residência de d. Veridiana, o palacete de d. Maria Angélica também marcou uma
época na cidade. Com nítida influência prussiana, já que inspirado no Palácio
de Charlottenburg, a construção, em posição elevada, era cercada de
jardins, criando uma ambiência de verdadeiro conto de fadas. Estava, pois,
configurada neste exemplo a nova maneira do saber morar da
elite paulistana. Data desse mesmo período a decisão de d. Maria Angélica,
agora como herdeira da propriedade, em abrir as primeiras ruas que formaram, de
início o bairro de Santa Cecília, e que depois se articularam com aquelas
abertas mais acima, em Higienópolis. Interessante notar que a atual Av.
Angélica, a primeira a ser aberta, ficou conhecida, em 1895, como “Avenida
Viúva Barros” conforme se apresenta no mapa da cidade daquele ano. Paralela a
esta avenida, o mesmo mapa mostra o primeiro treco da Rua Barão de Tatuí e uma
transversal que recebeu o nome de Alameda Barros. Por essa época, a Av.
Angélica estava aberta apenas no trecho entre a Rua das Palmeiras, onde tinha
início, e a esquina da Rua Jaguaribe, ou seja, nos limites da Chácara das
Palmeiras de D. Maria Angélica. Em 1898 a Câmara Municipal já pensava em
estendê-la até os Campos Elíseos, interligando-a com a Alameda Eduardo Prado,
num projeto que ficou conhecido como “Avenida Circular”. No seu lado oposto,
subindo para Higienópolis, também se desejava sua interligação com a avenida
Itatiaia, aberta na mesma época por Martinho Burchard entre as avenidas
Higienópolis e Paulista. Em maio de 1898 a municipalidade havia entrado em
acordo com os dois loteadores: Burchard de um lado e D. Maria Angelica de outro,
para que os mesmos dividissem as despesas das obras orçadas em 3:300$000 réis
(três contos e trezentos mil réis). Em 1899 as duas avenidas estavam ligadas,
mas mantendo, cada uma delas, as suas denominações. Em 1901, e devido à não
concretização do projeto apresentado em 1898 e que previa a sua ligação com a
Alameda Eduardo Prado, o vereador Serafim Leite ponderou: “Sendo a
Avenida Angélica uma das mais formosas desta cidade, e convindo liga-la com a
Alameda Prado, tornando-a assim muito mais longa, de modo a proporcionar belos
passeios às famílias desta Capital, indico que (...) se proceda aos necessários
estudos.” E ninguém negava o sucesso desse empreendimento levado a
efeito por d. Maria Angélica, tanto que também em 1901 ela solicitou e obteve
da Câmara isenção total de impostos pelo prazo de cinco anos para todos os
terrenos situados na Alameda Barros, Rua São Vicente de Paulo, na Avenida
Angélica e nas demais “ruas que abrir desta Avenida em direção à cidade” (Atas
01/10/1901). Por conta desse estímulo, d. Angélica promoveu a abertura de novas
na sua chácara e na medida isso ocorria, ela teve o cuidado de homenagear
membros de sua família. Uma delas já fazia referência ao seu marido (Alameda
Barros) e depois seria o caso de sua tia-avó (Rua Baronesa de Itu) e amigos da
família como o Conselheiro Brotero, o Dr. Gabriel dos Santos, e Brasilio
Machado, dentre outros. Em 1907 a Av. Angélica já chamava a atenção pelas belas
construções e foi justamente nesse momento que foi aprovada uma legislação
especial para ela. A proposta original foi do vereador Francisco Alves da Cunha
Horta Júnior que sugeriu: “Nenhuma casa poderá ser edificada na avenida
Angélica, sem que fique entre o alinhamento e a frente da casa um espaço de
seis metros, pelos menos, para jardins ou arvoredos, e bem assim um espaço não
menor de dois metros de cada lado.” Apesar de ser uma regra já
utilizada na Av. Paulista, por exemplo, a legislação por parte da Prefeitura
era uma grande novidade. Analisando essa questão, a então Comissão de Justiça
não apenas aprovou como também apresentou outra novidade que foi
incorporada: “A Comissão de Justiça, estudando o projeto do sr.
vereador Horta Júnior, e considerando que a avenida Angélica, pela sua
disposição poderá ser, no futuro, uma das melhores ruas desta cidade, si se
tornar obrigatório o plano de construção indicado neste projeto, plano aliás já
adotado nas várias construções ali iniciadas; considerando que este sistema de
construção se deve estender à av. Itatiaia que é o prolongamento da avenida
Angélica e que forma com esta uma avenida quase reta, resolve apresentar à
consideração da Câmara o seguinte substitutivo: Art. 1º - Fica denominada
avenida Angélica a avenida que, partindo da rua das Palmeiras, vai até a
avenida Municipal (...) Art. 2º - Nenhuma casa poderá ser ali edificada, sem
que fique entre o alinhamento e a frente da casa um espaço de seis metros, pelo
menos, para jardim ou plantação de arvoredos (...).” Após
deliberações, este projeto deu origem à Lei nº 1001 de 31/05/1907. Em 1912,
finalmente, através da Lei 1537 de 11 de maio, foi autorizado o prolongamento
da Avenida Angélica até a Alameda Eduardo Prado. Dona Maria Angélica pode
assistir o sucesso de seu empreendimento, já que faleceu em São Paulo no dia
10/10/1929, aos 87 anos de idade. Seu féretro saiu da Rua São Vicente de Paulo
nº 38 e seguiu até o cemitério da Consolação onde foi sepultada.
Fontes: HOMEM, Maria Cecília Naclério; “Higienópolis –
grandeza e decadência de um bairro paulistano”, Prefeitura de São Paulo, 1980. JORGE, Clovis
de Athayde; “Santa Cecília”, Prefeitura de São Paulo, 2006. Diário Nacional de
11/10/1929, Correio Paulistano 11/10/1929, 03/07/1877, 06/09/1879, 06/09/1879
(lista de eleitores), Diário de São Paulo 02/12/1865, O Estado de São
Paulo 13/12/1877, 18/10/1878, 23/06/1880 (anúncio) e 28/07/1886 (venda de
leite), Atas da Câmara 26/01/1907, 25/05/1907.
MAIS INFORMAÇÕES
Nomes Anteriores:
Avenida Itatiaia e Alameda Barros
Prefeitura Regional:
Se (SPSE)
Descrição Técnica:
Começa na Rua Barra Funda e Termina na Avenida Dr. Arnaldo. Bairro Santa
Cecília.
CADLOG:
01.356-0
Oficialização:
LEI nº: 1.001 de 31/05/1907
Lei nº 1.537, de 11 de maio de 1912, trata do prolongamento da via.
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